bell hooks: amor é coletivo, político e ética de vida

Historiadoras negras falam sobre as ideias revolucionárias da autora que completaria 70 anos em 2022

Por Anelize Moreira
Publicado no Brasil de Fato (ouça o áudio da entrevista)

 

A escritora, professora e ativista bell hooks trazia em suas obras dimensões subjetivas articuladas com questões sociais como o racismo, o feminismo, a política, a pedagogia, a dominação e a resistência. A autora morreu em dezembro do ano passado e deixou um legado imensurável para a literatura negra, segundo as historiadoras que conversaram com o Brasil de Fato. 

A feminista negra norte-americana escreveu mais de 40 livros publicados em 15 idiomas diferentes, alguns dos quais foram traduzidos no Brasil. Filha de zelador e de uma empregada doméstica, hooks foi educada em escolas segregadas nos Estados Unidos e publicou seu primeiro livro de poemas, And There We Wept, em 1978.

Em 2020, a educadora e historiadora Silvane Silva foi convidada pela Editora Elefante para escrever o prefácio da edição brasileira do livro Tudo sobre o amor: novas perspectivas. Ela explica que a autora acredita que o amor vai muito além do amor romântico, da afeição por alguém. Para ela, o amor é ação, e está ligado à ética e ao coletivo.

“bell hooks mostra o quanto é importante para comunidade que nós tenhamos o amor como ética e que possamos construir uma noção de amor que valoriza não o individualismo, como a sociedade capitalista está acostumada, mas sim uma noção de amor que é construída e é valorizada por meio da convivência em comunidade”.

Como definir as ideias revolucionárias de bell hooks? Diferente dos grandes teóricos da academia, hooks fazia questão de escrever de forma didática e acessível para que todas as pessoas que se interessassem pela sua literatura pudessem ler os seus escritos. E por isso, sofreu críticas ao longo da sua carreira por não ser “acadêmica o suficiente”.

“Isso é algo de uma grandeza imensa, porque poucos acadêmicos conseguem alcançar o que ela traz, que é uma profundidade de conceituação alinhada a uma linguagem simples, que atinge a todos, e que principalmente traz todas as relações práticas do cotidiano para os conceitos e reflexões que ela utiliza. A preocupação dela era que a teoria pudesse nos curar, pudesse nos auxiliar a viver e pudesse ajudar no nosso dia a dia”, diz Silva.

A autora percorreu durante a sua trajetória temas que vão desde teoria crítica a práxis pedagógica e cultural, feminismo, amor, espiritualidade, autoestima e também alguns livros voltados ao público infantil. Então como começar a ler bell hooks? Silvane indica Ensinando a transgredir: a educação como prática de liberdade, além de livros que tenham uma temática de interesse.

“Enfrentar o medo de se manifestar e, com coragem, confrontar o poder, continua a ser uma agenda vital para todas as mulheres”, escreve bell hooks no prefácio à nova edição de Erguer a voz: pensar como feminista, pensar como negra. E é este livro que a historiadora e psicanalista Mariléa de Almeida, autora do livro Devir quilomba: antirracismo, afeto e política nas práticas de mulheres quilombolas indica pra quem nunca leu bell hooks e quer entender as ideias da autora.

“Eu acho que um aspecto fundamental na obra da bell hooks é a relação que ela tem com a palavra. Ela acredita que a transformação do mundo também ocorre por ela, também ocorre pelo gesto do uso da voz e da palavra. Então eu recomendaria o Erguer a voz que é um livro em que a bell hooks coloca no centro da discussão esse processo de silenciamento que vai se dando especialmente em relação às mulheres negras. E. de certa forma, ela vai trazendo como é que a fala e a voz para as mulheres negras ocupam um lugar singular”, explica Almeida.

Mariléa diz que conhecer bell hooks foi um divisor de águas em sua carreira. A leitura das obras ajudou a historiadora a se autorizar como mulher negra, intelectual, professora, pesquisadora e escritora. “Ela funciona para mim como uma convocatória, sabe? Como se estivesse sendo convocada a aprender a usar a minha voz, a minha inteligência, a minha capacidade intelectual e a minha energia a serviço da dignidade humana”.

A autora completaria 70 anos este ano e, em homenagem póstuma, a Editora Elefante anunciou que publicará pelo menos mais seis livros de bell hooks.

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